Tempos
atrás comprei uma boneca bem interessante. Ela vem com as pernas
encolhidas presas entre os braços. Os braços formam um nó que
segura e paralisa as pernas. Comprei também uma lata de lixo um pouco
maior do que ela, e criei uma história, onde essa boneca passa a
morar nesta lata de lixo devido a baixa autoestima.
Me peguei pensando que esta mesma boneca utilizada na clínica e em palestras, para trabalhar o tema da baixa autoestima com mulheres, quando sozinha e sem a lata de lixo que a acompanha, pode ser também utilizada como uma metáfora para trabalhar acerca do que o medo as vezes faz com as pessoas: paralisa-as.

O medo que
uma criança tem de colocar a mão no fogo ou o dedo na tomada, pode
ser extremamente positivo e
protetor. Ou ainda o medo e a atenção consequente de um
estado de alerta,
que surge quando uma pessoa pensa em realizar algo que envolve certo
risco. Nestes casos o medo é
algo altamente benéfico.
O medo
passa a ser negativo em pelo menos duas outras situações. Quando a
pessoa convive com ele por um longo período de tempo, e quando ele é
“ilusório” e “desnecessário”.
No
primeiro caso ele é ruim, pois, a reação de medo desencadeia
stress no organismo. O stress envolve um longo processo de
alterações bioquímicas que impacta o organismo e visa prepará-lo
para uma ação de luta ou fuga. O stress “é uma reação
psicofisiológica muito complexa que tem a sua gênese na necessidade
do organismo fazer face a algo que ameace sua homeostase interna.”
(LIPP). Segundo Marilda Lipp, o stress
é um processo, e não uma reação única.
Diante do
evento estressor, que mobiliza o organismo através de mudanças
bioquímicas para o enfrentamento da situação e preservação da
vida, se a situação se resolve, e no tema aqui abordado, o medo por
exemplo, é superado, o organismo volta à seu equilíbrio natural,
ou homeostase. Mas se a situação persiste, instala-se então um
processo no qual, o organismo que estava numa primeira fase de
stress, a fase de alerta, “que contribui para maior produtividade
no ser humano” (LIPP) e que nesta fase podemos considerar um stress
bom, segue adentrando a outras fases de mobilização de mais
energias na tentativa de resistir ao elemento estressor - o medo. O
stress segue então para etapas mais avançadas do processo nas quais
as defesas do organismo começam a ceder e ele já não dá mais
conta de resistir e recobrar a homeostase. O organismo vai sofrendo
desgaste generalizado com consequências diversas como por exemplo,
impacto na imunidade e a manifestação de doenças diversas de cunho
físico e mental. Segundo Lipp, pode ocorrer a morte como resultado
final à tentativas prolongadas de resposta do organismo a um stress
que perdura por longo período.
A pessoa
sob stress sente o impacto deste processo em várias facetas da sua
vida: no trabalho, na família e demais relações afetivas e
sociais. Conforme Lipp, “No âmbito psicológico e emocional do ser
humano, o stress excessivo produz cansaço mental, dificuldade de
concentração, perda de memória imediata, apatia e indiferença
emocional. A produtividade sofre quedas e a criatividade fica
prejudicada. Autodúvidas começam a surgir em virtude da percepção
do desempenho insatisfatório. Crises de ansiedade e humor depressivo
se seguem. A libido fica reduzida e os problemas de ordem física se
fazem presentes. Nestas condições a qualidade de vida sofre um dano
bastante pronunciado e frequentemente os pacientes, nesta situação,
relatam 'vontade de fugir de tudo'. ” (LIPP)
Mas o medo
não é negativo apenas quando ele é vivenciado de modo demorado.
Ele é negativo também quando decorre desnecessariamente na vida,
quando é ilusório. Há situações nas quais o medo é provocado
por uma distorção da percepção. Nestes casos ele não seria
necessário, mas acontece muitas vezes pela supervalorização de
algo, ou pela pressuposição de algo que realmente não existe, mas
passou a existir pela percepção distorcida das coisas, das pessoas
ou das relações. Passou a existir na mente da pessoa. Passou a
afetar suas emoções, suas ações e sua vida.
Uma das formas possíveis desse afetamento é a paralisação na vida ou até mesmo, em alguns casos, da própria vida. É nestes casos que digo que o medo encolhe. Metaforicamente falando, ele pode encolher a expressão de pensamentos, a manifestação de afetividade, o progresso na carreira profissional, a construção de novos projetos de vida, a realização de sonhos. Nestes casos, o medo muitas vezes vem acompanhado de preocupação. Uma ocupação e sofrimento antecipados decorrentes de sentimentos e pensamentos de que algo ruim ou catastrófico pode vir a acontecer. O problema é que, a vida da pessoa, sua qualidade de vida, e muitas vezes suas relações são afetadas por essa pre-ocupação, que as vezes, também não seriam necessárias, como por exemplo nos casos de percepção distorcida da realidade.
A boneca
encolhida que comprei, faz-me lembrar que a
pessoa encolhida fica muito menor do que o seu tamanho real. A
pessoa encolhida fica menor do que realmente é, e
assim é que se coloca na vida.
O medo encolhe. Por isso para seguir a diante é necessário
buscar superá-lo para poder desencolher-se e seguir em frente na
vida.
Enfrentar
os seus medos e aprender a lidar com eles, nem sempre é
fácil. É preciso coragem. Mas
de fato, viver e não apenas sobreviver enquanto se está vivo,
exige ousadia, e o enfrentamento do medo, muitas vezes nos
mostra, que aquele sofrimento por ele causado era desnecessário,
possibilitando uma renovação da pessoa ao superar aquilo que lhe
paralisava, bem como melhores relacionamentos e uma melhor qualidade
de vida.
Flávia Diniz
Roldão
Psicóloga, Pedagoga e Teóloga.
Psicoterapeuta individual, de casais e familias.
Trabalha com Arteterapia e desenvolvimento humano.
Contato: flaviaroldao@gmail.com
Psicóloga, Pedagoga e Teóloga.
Psicoterapeuta individual, de casais e familias.
Trabalha com Arteterapia e desenvolvimento humano.
Contato: flaviaroldao@gmail.com
REFERÊNCIAS:
LIPP, M. E.
N. Mecanismos neuropsicofisiológicos do stress. In: LIPP, M. E. N.
Mecanismos neuropsicofisiológicos do stress: teoria e
aplicações clínicas. São paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
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